Amor e Intriga na Corte: As Cartas de Henrique VIII para Ana Bolena
- Anna Gabriela Mineiro
- 4 de jul. de 2024
- 6 min de leitura

No turbilhão da história da realeza britânica, poucos relacionamentos foram tão emblemáticos e controversos quanto o de Henrique VIII e Ana Bolena. Entre os registros desse romance apaixonado e tumultuado, destacam-se as cartas trocadas entre o rei e sua segunda esposa, que revelam uma complexa trama de amor, desejo e intriga política.
As cartas que Henrique VIII escreveu para Ana Bolena são verdadeiros tesouros históricos que nos proporcionam um vislumbre íntimo de seu relacionamento. Eles são testemunhas silenciosas de um período marcante na história da Inglaterra, em que a paixão do monarca pela jovem dama da corte abalou os alicerces da monarquia.
Nas cartas, Henrique VIII expressa seu amor profundo e ardente por Ana Bolena. Ele a descreve como a mulher mais bela e encantadora de todas, alguém que o conquistou completamente. Suas palavras transbordam de paixão, promessas de fidelidade e um desejo insaciável pela presença de sua amada. Cada linha escrita por sua mão revela um homem apaixonado, disposto a desafiar convenções e até mesmo a Igreja para estar ao lado de sua amada Ana.
No entanto, por trás dessas declarações amorosas, as cartas também revelam uma dimensão política intrincada. Henrique VIII buscava desesperadamente um herdeiro masculino para o trono, e a influência de Ana Bolena nessa busca tornou-se cada vez mais evidente. O rei, desejando legitimar seu divórcio da rainha Catarina de Aragão, via em Ana a solução para seus anseios.
Primeira carta:
Revolvendo-me no meu pensamento o conteúdo das vossas últimas cartas, eu me acho nos tormentos mais dolorosos, não sabendo se elas me são desfavoráveis, como compreendo em muitos pontos, ou favoráveis, como me parecem em alguns outros; eu vos suplico agora, com o mais intenso ardor, que me façais reconhecer inteiramente as vossas intenções, pelo que respeita ao amor entre nós dois.
É absolutamente preciso que eu tenha de vós essa resposta, porque há mais de um ano fui ferido pelo dardo do amor, e não sei ainda se tive mau êxito ou se acharei lugar no vosso coração e no vosso afeto, já que este último ponto impediu-me por algum tempo passado de chamá-la de minha amante, porque, se você só ama-me com um amor comum, esse nome não é adequado para você, porque se denota um amor singular, isso está longe de ser comum. Mas se lhe agradar cumprir o pape de uma verdadeira e leal amada e amiga, e entregar-se de corpo e coração a mim, que tenho sido, e serei, seu muito leal servidor ( se sua austeridade não mo impedir), prometo-lhe que não somente esse título lhe será concedido, mas também que a terei como minha única amada, banindo todas as outras que não você da minha mente e da minha afeição, para servi-la exclusivamente.Eu vos peço que deis uma resposta bem clara a esta minha rude carta , de modo que eu possa saber com que posso contar e até que ponto. Se não lhe agradar responder por escrito, faça-me saber de algum lugar onde possa obter a resposta de sua boca, lugar onde hei de buscar com todo o meu coração. Não acrescento mais nada, pelo temor de fatigar-vos.
Sem mais, por medo de te cansar.
Escrito pela mão daquele que seria de bom grado seu,
H.R.
As cartas de Henrique VIII para Ana Bolena também demonstram uma personalidade inconstante e impulsiva. À medida que o tempo passava e suas expectativas não eram totalmente atendidas, as palavras de amor começaram a se misturar com frustração e até mesmo raiva. Henrique VIII passou de amante apaixonado a um homem cada vez mais impaciente e impetuoso, o que desencadeou eventos que culminariam na queda de Ana Bolena.
Segunda carta:
Embora não seja apropriado para um cavalheiro levar sua dama em lugar de um servo, ainda, cumprindo com o teu desejo, eu ansiosamente lhe garanto, se encontrar-se menos desconfortável no lugar escolhido por você, que esteja no que eu lhe dou, a gradecendo-lhe cordialmente por você ainda estar satisfeita em ter uma lembrança de mim.
Terceira carta:
Embora, minha Senhora, não tenha sido adorável lembrar-se da promessa que me fez na última vez em que estive com você – que era de receber boas notícias tuas e uma resposta à minha última carta -, ainda parece-me que pertence a um verdadeiro servo (observando que, de outra forma, ele não pode saber de nada), para perguntas sobre a saúde de sua Senhora e para exercer as obrigações de um servo de verdade, eu lhe mando esta carta, rogando-vos que me ponha a par do teu bem-estar, que eu rezo a Deus que continue por tanto tempo quanto o que desejo a mim mesmo. E para causar-lhe ainda mais frequente lembrança de mim, mando-vos por este mensageiro um gamo morto pelas minhas mãos a noite passada, e espero que comendo-o pensareis no caçador. Por falta de espaço fecho a minha carta. Escrita pela mão do vosso servidor, que muitas vezes deseja que estivésseis no lugar de vosso irmão.
H.R.
Quarta carta:
Minha Senhora e amiga, meu coração e eu nos rendemos em suas mãos, rogando-vos para nos manter atrelados ao seu desejo, e que seu afeto por nós não possa ser diminuído: porque seria trágico aumentar ainda mais nossa dor, da qual a distância já produz mais do que eu poderia ter pensado que podia ser sentida, lembrando-me de um apontamento da astronomia que diz: quanto mais longos os dias são, mais distante está o sol e menos quente e assim é o nosso amor, por ausência somos mantidos em distância um do outro, e mesmo que ele mantenha seu fervor, pelo menos do meu lado, e espero que o mesmo de você, assegurando-lhe que a dor da ausência é grande demais para mim; e quanto penso no aumento disso que sou forçado a sentir, seria quase intolerante, mas pela firmeza de minha esperança em sua imutável afeição por mim: e para lembrar-lhe disso de vez em em quando, e observando que não posso estar presente em pessoa junto a você, envio-lhe a coisa mais próxima disso, isto é, meu retrato esculpido em braceletes, com todo o aparato, que já conhece, desejando estar no lugar deles, quando for de seu agrado.
Pela mão de seu fiel servo e amigo,
H.R.
Quinta carta:
Eu vos agradeço de todo o coração o presente que não poderia ser mais precioso, não só pelo valor do diamante e pelo batel em que é batida das ondas a solitária Donzela, mas sobretudo pela engenhosa interpretação e pela demasiadamente humilde submissão que a vossa bondade me fez; porque eu penso que me seria muito difícil achar a ocasião de merecê-la, se não fosse assistido da vossa grande bondade e do vosso favor, que tanto procurei, procuro ainda e procurarei sempre conservar por todos os meios ao meu alcance; esta é a minha firme intenção e esperança, segundo a divisa: aut illic aut nullibi *.
As vossas demonstrações afetuosas são tais, os delicados pensamentos da vossa carta são expressos tão cordialmente que me obrigam para sempre a honrar-vos, amar-vos e servir-vos sinceramente, suplicando-vos que persistais com firmeza e constância no vossos sentimento; e assegurando-vos que, de minha parte, não só vos corresponderei, mas, se possível, vos superarei em plena lealdade de coração.
Eu vos peço também que, se antes deste dia alguma vez vos ofendi, me concedais de bom grado aquele mesmo perdão que me pedís, e asseguro-vos que de agora em diante o meu coração será dedicado só a vós; eu desejo que seja o mesmo com o meu corpo; Deus pode fazê-lo, se tal é a sua vontade; e eu lhe rogo todos os dias com esta intenção, esperando que a final das minhas preces serão ouvidas.
Eu espero que dentro em pouco poderemos tornar a ver-nos, mas o tempo me parecerá longo. Escrita pela mão daquele que, de coração, de corpo e vontade, é
Vosso mais leal e fiel servidor
Sexta carta:
À minha Senhora. Porque o tempo parece mais longo desde que soube sobre você e sua saúde, a tamanha afeição que tenho por você levou-me a enviar-lhe este portador, afim de melhor ser informado sobre sua saúde e sobre você, e porque, desde minha despedida de você, eu tenho dito que a opinião sobre eu ter te deixado mudou totalmente, e você não virá para a corte nem com a sua mãe, ou de qualquer outra forma, a notícia, se verdadeira, eu não poderia mostrar mais assombro, porque eu tenho certeza que nunca fiz nada para te ofender, parece-me compensação bem pequena do grande amor que vos dedico o ser conservado a distância da única mulher que mais estimo no mundo; e se você me ama com tanta afeição quanto eu espero, eu tenho certeza que a distância de duas pessoas seria um pouco maçante para você, embora isso não pertença ao amante como o servo. Considerai bem, minha senhora, quanto me penaliza a vossa ausência; eu espero que isso não seja pela vossa vontade; mas, se estivesse certo de que vós o desejais, não me restaria mais do que lamentar-me da minha desgraça e tentar a pouco e pouco curar-me da minha loucura; e assim, faltando-me tempo para continuar, termino esta rude carta, suplicando-lhe para dar crédito a este portador de tudo que ele irá lhe dizer de mim. Escrito pela mão do seu inteiro servo,
HR.
Embora as cartas de Henrique VIII para Ana Bolena tenham sobrevivido ao teste do tempo, sua história de amor não teve um final feliz. A rainha foi acusada de adultério, traição e bruxaria, sendo executada em 1536. Assim, as palavras de amor registradas nessas cartas permanecem como testemunhas silenciosas de um relacionamento que desafiou as convenções sociais e, ao mesmo tempo, acabou destruindo a vida de Ana Bolena.'''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''''